quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Mulheres da Vida



Sinopse:

Estando colocadas no centro de muitos debates científicos e políticos, a prostituição e outras práticas sexuais marcadas pelo interesse económico explícito são um factor de divisão e de conflito entre forças políticas progressistas, incluindo clivagens no seio do movimento feminista. Como o leitor constatará (e avaliará), uma linha de força, simultaneamente de inquietação e proposição, perpassa o livro: compreender de forma densa o fenómeno do sexo mercantil, tendo em vista a produção de contributos que possam enriquecer uma agenda política emancipatória comprometida com a definição de políticas de cidadania orientadas para a não-discriminação e a não-estigmatização dos modos de vida e das práticas, incluindo as que se relacionam com o corpo, dos actores sociais que vivem do comércio do sexo.

http://www.wook.pt/ficha/mulheres-da-vida/a/id/9632641/filter/

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

140 mil casos de tráfico em 2009?!?

«PCP quer proibir anúncios de prostituição na imprensa
por Sílvia Caneco, Publicado em 19 de Outubro de 2010

O tráfico humano rendeu 2,5 mil milhões de euros na UE no ano passado, revelou António Guterres. PCP apresentou ontem projecto de resolução para que prostituição seja reconhecida como exploração.

Anúncios com fotografias de corpos semi-despidos acompanhadas de frases curtas a sugerir "convívio", "prazer total", "serviço completo" ou a descrever atributos corporais e idade devem ser banidos dos media. A proibição de publicidade de incentivo à prostituição nos jornais é uma das medidas propostas num projecto de resolução do PCP apresentado ontem na Assembleia. O diploma visa que o Governo reconheça a prostituição como forma de exploração.

A deputada comunista, Rita Rato, esclarece que, apesar de alguns anúncios poderem ser colocados a título particular, "a prostituição é sempre uma forma de exploração" e "a exploração do ser humano deve sobrepor-se à liberdade de opção de cada pessoa". A deputada não tem dúvidas de que o Governo tem poder para intervir junto dos media e deve fazê-lo, tal como "já fez com o álcool ou com o tabaco". "O lenocínio e outras práticas associadas à prostituição são crime. Se esses anúncios incitam à prostituição, o Governo tem todo o direito de proibir essa publicidade", justifica a deputada do PCP.

Os restantes grupos parlamentares, contactados pelo i, recusaram pronunciar-se sobre a proposta, alegando desconhecer o teor do diploma. A deputada social-democrata Teresa Morais adianta que "veria sempre com bons olhos qualquer medida que pretenda desincentivar a prostituição", mas sublinha que essa é uma posição "a título exclusivamente pessoal". "Não posso dar uma posição do grupo quando ainda não lemos o projecto nem o discutimos."

O PCP aproveitou o facto de se assinalar, ontem, o Dia Europeu contra o Tráfico de Seres Humanos para entregar o diploma. Além de exigir ao Governo o reconhecimento da prostituição como exploração, o projecto de resolução apresenta medidas concretas de combate ao tráfico de seres humanos.

Os comunistas defendem a criação de uma linha telefónica SOS, o reforço da rede de casas de abrigo e "um instrumento financeiro transitório de apoio" às vítimas. "Estamos dispostos a negociar qual seria a ajuda financeira e de que modo seria prestada. Queremos é que uma vítima de rede de tráfico tenha apoio durante um período que lhe permita sair desse círculo, arranjar uma casa e um emprego."

A "isenção de custas judiciais" para "as vítimas de tráfico e pessoas prostituídas" é outra das medidas defendidas. As vítimas que seguem para tribunal num processo contra o proxeneta, por exemplo, são hoje obrigadas a assegurar o pagamento das taxas de justiça.


Tráfico rende 2,5 mil milhões O alto comissário das Nações Unidas para os Refugiados, António Guterres, anunciou os números - o tráfico de seres humanos rendeu 2,5 mil milhões de euros na UE em 2009 - e lamentou que os meios empregues no combate ao tráfico humano não sejam "proporcionais ao volume de negócios praticados na UE por criminosos".

À margem da conferência evocativa do Dia Europeu de Luta contra o Tráfico de Seres Humanos, em Loures, Guterres alertou para a necessidade de concentrar atenções na "protecção das vítimas e sua integração na sociedade" e não só "no crime".

Em Portugal, registaram-se, em 2009, 140 mil casos de vítimas de tráfico: 84% dessas vítimas tinham sido traficadas para fins de exploração sexual.

O ministro da Administração Interna, Rui Pereira, apresentou o II Plano Nacional contra o Tráfico de Seres Humanos. Em Junho, um relatório sobre tráfico de pessoas publicado pelo Governo dos EUA, situava Portugal no segundo grupo do ranking de países que "não cumprem os requisitos mínimos para o combate" ao tráfico».

http://www.ionline.pt/conteudo/84018-pcp-quer-proibir-anuncios-prostituicao-na-imprensa

Lá está novamente a confusão entre prostituição e tráfico. Claro que tod@s @s trabalhador@s do sexo precisam de saber que podem seguir outras vidas, que há alternativas. Mas a maioria sabe. E muitas das pessoas que trabalham neste campo, trabalham noutras actividades. Em muitos casos, o trabalho sexual é um complemento de rendimento. Há quem se prostitua à noite e durante o dia trabalhe num café, numa loja, num bar, em limpezas ou no serviço doméstico.
O combate ao lenocínio e ao tráfico é necessário, mas não com maior marginalização d@s trablhador@s do sexo! Marginalizadas já el@s estão. É preciso é integrá-l@s! "Vamos proteger as vítimas". Muito bem. E as que não são consideradas vítimas? Mantém-se a distância, o pudor, e a legislação, o direito a ter direitos?!?
E acabar com anúncios de jornal?! Quando a maioria vive desses anúncios?
Eliminar a exploração sim! Mas não eliminar a sobrevivência das pessoas! Há quem trabalhe nesta área por opção própria (lamento, não quero ofender nenhuns ouvidos ou olhos), mas é o que tenho constatado.
A solução talvez passasse por alguma informação. Como é que os políticos convencionais querem saber como é este mundo, se não o conhecem? Se não o vão ver com os seus próprios olhos? Se não falam com as pessoas sobre quem tencionam legislar?
E 140 mil casos de tráfico em 2009 em Portugal?! Onde é que vão buscar estes números?!?
Para quê atirar areia para os olhos, para quê lançar números falsos, gerando pânicos, quando mesmo debaixo no nosso nariz estão vidas que precisam de apoio e de reconhecimento?!? Quem no seu perfeito juizo pretende eliminar o tráfico para fins de exploração sexual, sem primeiro "empoderar", capacitar o grupo onde supostamente se encontrarão as vítimas, e torná-las cúmplices activas no combate ao crime que se diz ocorrer no seu seio profissional?!?
Porque é que, para proteger vítimas profundamente invisíveis, é preciso manter nas margens um grupo tão grande e visível? Quem é que ganha com esta situação?

sábado, 4 de dezembro de 2010

Na noite de Lisboa

Numa noite fria de inverno, encostadas à "esquina do costume", ouvi:

"Nós aqui na rua somos tratadas como lixo. Mas há quem diga: “desculpe minha senhora, venho só falar um bocadinho” (Lucrécia, 63 anos).

Mulheres Brasileiras em Portugal

http://www.fazendogenero.ufsc.br/9/resources/anais/1277741002_ARQUIVO_ComunicacaoCompletaFG9_SoboveudosDireitosHumanos.pdf

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

1º Seminário de Estudos sobre Imigração Brasileira na Europa

O Seminário acontecerá, entre os dias 25 e 27 de novembro de 2010, na cidade de Barcelona.No evento serão apresentados 45 trabalhos realizados por pesquisadores e pesquisadoras sobre a imigração brasileira em diferentes países da Europa (Portugal, Espanha, Inglaterra, França, Itália, Suíça, Alemanha, Bélgica e Irlanda). O Seminário ainda contará com a três Mesas Redondas compostas pelos participantes das instituições colaboradoras do evento: Gedime (Grup d´Estudis d´Immigració i Minories Etniques), Geb (Grupo de Estudos sobre Brasileiros no Reino Unido) e Grupo de Multiculturalisme i Gènere (Universitat de Barcelona), além de apresentações de trabalhos dos membros do comitê científico. O I seminário de estudos sobre imigração brasileira na Europa é uma iniciativa do Coletivo Brasil-Catalunya (CBC) e da Associação de Pesquisadores e Estudantes Brasileiros na Catalunya (Apec).

http://seminariobrasileuropa2010.wordpress.com

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

ele não é...pois não?

Nova ronda nocturna, colectiva, pelas ruas de Lisboa.

No Parque Eduardo VII, um homem, jovem, brasileiro, sentado num dos bancos do parque, na penumbra.
- Olá, somos de uma organização que presta apoio a trabalhadores do sexo...
- Trabalhadores do quê?!
- Do sexo. Prostitutas e prostitutos.
- Ah, legal, sei que que estou num sítio...mas eu não sou. Só estou esperando um amigo [que não se vê em parte alguma].
- Ok, bom, mas fica a conhecer-nos. Precisa de preservativos?
- Ah não, não! Eu sou casado.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Corpos (I)Morais *

«I would suggest that those readers look about themselves and observe the real place of men and women in the various contexts of our social life, and in the images, ideas, and desires that represent them and represent them to each other» (Godelier, 1996:237)

Uma das ferramentas mais eficazes para pensar o “outro” é o género. Construção e papel social, divisão do trabalho sexual, corporalidades, sexualidades, moralidades, estas categorias confinam e determinam o “lugar” que deve ser ocupado por cada agente e actor social, pensados em termos de feminino vs masculino.

As relações de género, assentes essencialmente no papel da sexualidade, são um importante e permanente factor de aquisição de poder real e simbólico em qualquer sociedade. A relação entre o sexo masculino e sexo feminino não é uma relação de dois pólos. O homem representa, ao mesmo tempo, o pólo positivo e o neutro, de tal forma que utilizamos a expressão “homem” para referir os seres humanos.

O estudo as relações de género exige a análise das transformações históricas, sociais, económicas e políticas, e permite valorizar conceitos como experiência e agência. As categorias de género atravessam as divisões de classe, de etnicidade e comunidade. Estas categorias são antes localizadas nos interstícios das práticas e ideologias individuais e institucionais (Goddart, 2000: 3). Os corpos sociais são hoje vistos à luz do que se tem assimilado ao longo da história da humanidade. Muito do que assumimos como “verdade” é um produto e um estereótipo do tempo. Como escreve Grittner, «seria presunçoso pensar que estamos imunes a ulteriores versões da história» (Grittner 1990: 189). De igual forma, muito do que se pensa hoje do corpo feminino é um produto temporal estereotipado.

Neste texto, proponho irmos sumariamente em busca das origens da ideia do corpo feminino, utilizando uma perspectiva construtivista (Jenkins 1992 e Spector e Kitsuse 1977). Como é que a mulher tem sido representada? Que lugar lhe tem sido atribuído? O que acontece quando as regras são quebradas? Quais as visões por detrás da ideia de “má mulher”? Para procurar responder a estas perguntas navegaremos pelo conceito de “prostituição”, o mais flagrante exemplo do que é uma mulher “fora das normas”. A ideia de virgem ou mãe vs prostituta continua a minar as percepções sobre a feminilidade e o seu lugar devido. Porém, não são apenas as prostitutas que sofrem o estigma associado à sua profissão. As Devadasi são disso um bom exemplo: sacerdotisas hindus casadas com o seu Deva, foram percepcionadas pelo colonizador como “prostitutas”, visto entregarem os seus corpos em relações sexuais fora do casamento tradicional. As mulheres que empregam o seu corpo, ou melhor, os seus órgãos sexuais, reprodutores tornam-se menos pessoas à luz da sociedade. Os seus corpos tornam-se imorais, impuros. Qual é a origem e o argumento que sustenta a exclusão e imoralização da mulher que utiliza o seu corpo para a sua própria sobrevivência?

Corporalidades

O corpo da mulher tem sido, ao longo dos tempos, classificado, representado, domesticado. Desde os primórdios, a feminilidade é pensada. Gimbutas (1999) sublinha que muitos dos objectos arqueológicos paleo-históricos, alguns datados de 6200-6100 A.C. (Período Neolítico) são representações da sexualidade feminina: vulva, peito e nádegas são profusamente representadas em múltiplas figuras, desde o Período Paleolítico. O papel sagrado da Grande Deusa e a fertilidade acentuavam o papel essencial da corporalidade feminina.




Figura 1 – Vênus de Willendorf

Com o estabelecimento do sistema patriarcal, e mais tarde do monoteísmo, porém, tudo começa a mudar. A feminilidade perde o seu estatuto. A sexualidade feminina desenfreada é intolerada. De facto, «as mulheres podem ser sedutoras (como no Islão), tentadoras e pecadoras (como Eva na religião cristã) ou encantadoras (como na religião judaica). Mas nas três religiões do Livro elas têm uma única vocação: dar à luz. Daí decorrendo o seu lugar na sociedade» (Ramonet, 2004:216, nossa ênfase).

A dado passo de Sexo e Carácter, a célebre obra do misógino Otto Weininger , pode ler-se o seguinte: «A mulher adapta-se em tudo ao homem como o escrínio a uma jóia, as ideias do homem tornam-se as suas ideias, os gostos dele os seus próprios gostos, cada palavra que ele pronuncia, um acontecimento, e isso tanto mais pronunciadamente quanto maior for a atracção sexual entre eles. A mulher não sente essa influência do homem como um entrave ao seu próprio desenvolvimento, não se defende dela como de uma ingerência estranha dentro de si, não procura desfazer-se dela como de algo que constitua um atentado à sua própria vida, numa palavra, não sente nenhuma relutância em ser receptiva, coisa que pelo contrário lhe agrada, esperando até que o homem a force a essa atitude. Quer a dependência, e não deseja do homem mais do que uma coisa, que ele permita enfim que ela se torne perfeitamente passiva» (Weininger, 1975:215).

O leitor dos nossos dias não deixará seguramente de chocar-se com textos como este, sobretudo quando se lembra que foram escritos já no início do século XX. Alguns invocarão a seu respeito outros textos homólogos, como o conhecido passo do Assim Falava Zaratustra, de Nietzsche: «Vais ter com mulheres? Não te esqueças do chicote!».

E no entanto esquecemo-nos que estas frases, que nos parecem hoje muito incompreensíveis ou muito perversas, não fazem senão ecoar um ponto de vista que foi moeda corrente entre quase todas as culturas (incluindo a nossa cultura judaico-cristã) e se prolongou no tempo ao longo de talvez mais de dois milénios.
O próprio Weininger não deixa, a esse propósito de lembrar que, para Aristóteles, era o princípio masculino que representava na procriação o princípio formador e activo, o logos, enquanto o feminino representava apenas a passividade da matéria (Weininger, 1975: 159).

E idêntico ponto de vista pode encontrar-se num livro de Julius Evola, Rivolta contro il Mondo Moderno: «No simbolismo tradicional, o princípio sobrenatural foi concebido como “masculino”, enquanto o da natureza e do devir era tido por “feminino”. Para a cultura helénica, masculino é o “uno” – τό έν – que “existe em si mesmo”, completo e suficiente; feminina é a díade, princípio do diverso e do “diferente de si”, e por conseguinte também do desejo e do movimento. Em terminologia indú (Sâmkhya), masculino é o espírito impassível – purusha – feminino é prakrti, matriz activa de todas as formas condicionadas. A tradição extremo-oriental exprime, na dualidade cósmica do yang e do yin, conceitos equivalentes, sendo que o yang – princípio masculino – é associado à “virtude do céu” e o yin, princípio feminino, à “virtude da terra”» (Evola, 1969: 200).

De onde provêm estas construções ideológicas? Para o compreendermos, vamos recorrer a uma obra de Mircea Eliade, Tratado de História das Religiões. Nesta obra, existe um capítulo intitulado «A Terra, a Mulher e a Fecundidade», cujo argumento central é o de que «o par divino Céu-Terra é um dos motivos de fundo da mitologia universal (Eliade, 1977: 294). Sucede que, nesse par, a Terra é nossa mãe, o Céu é nosso pai. Conforme referem os Kumama, um povo agrícola da África austral, «o Céu fertiliza a Terra pela chuva, a Terra produz os cereais e as plantas» (Ibid: 296). Esta metáfora levou à constituição de uma concepção do mundo, típica das sociedades agrícolas, assente na existência de uma «solidariedade reconhecida entre a fecundidade da gleba e a da mulher» (Ibid: 311).

Assim se foi, de qualquer modo, vivendo. Até que, no último quartel do século XIX, o mundo começa a ficar “louco”. Dá-se então um duplo acontecimento: o ocidente redescobre fascinado as culturas e os povos exóticos que até aí só tinha encarado como universos potencialmente exploráveis, e atribui-lhes uma sensualidade fora do comum, feita precisamente do abandono das ilusões idealistas, segundo um esquema mental que identificava o «primitivo» e aquele conhecimento da fisicalidade que o próprio ocidente, por excessivo requinte civilizacional, estava a perder (por ex., Gauguin e o Taiti; ou D.H. Lawrence e a memória da cultura azteca, em A Serpente Emplumada); e ao mesmo tempo começa a descobrir o feminino como o ideal mimético para o qual toda a humanidade tendia.

No entanto, se a sexualidade humana muda de paradigma consoante o ambiente social e material da vida se altera, então a sexualidade é de facto, excluída uma base instintiva residual, um complexo de sentidos culturalmente determinado.
Actualmente, contudo, a maioria dos homens pró-ocidentais não coloca a mulher como um ser inferior, ou pelo menos não explicita essa pretensão. Estão, agora e na sua maioria, demasiados compenetrados com o ideal democrático, para não reconhecer todos os seres humanos como iguais. O homem pode, pois, persuadir-se de que já não existe hierarquia social entre os sexos e que, através das diferenças, a mulher é sua igual. Hoje em dia, de facto, as mulheres estão finalmente em vias de destruir o mito da feminilidade e começam afirmar a sua independência. Este processo é, contudo, de difícil concretização. Como diz Simone De Beauvoir:

«Educadas por mulheres, no seio de um mundo feminino, o seu destino normal é o casamento, que ainda as subordina praticamente ao homem; o prestígio viril está longe de ser apagado; assenta ainda em sólidas bases económicas e sociais. É, pois, necessário estudar com cuidado o destino tradicional da mulher» (Beauvoir, 1976:9).

Se o destino da mulher não é o “casamento” – entenda-se, se a mulher não restringe os seus ímpetos sexuais, se não se oferece apenas em virtude do “amor”, se não acolhe o seu papel de esposa, mãe, trabalhadora e gestora de lar -, enfim, se ela não ocupa o seu “lugar” normal na sociedade, torna-se um elemento estranho, exterior ao normativo e exige nomeação binária: as mulheres que se regem pelas regras sociais são “mulheres de bem”; às outras atribui-se o nome de puta. Nesta categoria, colocam-se frequentemente as mulheres que utilizam a sua corporalidade para desenvolver as suas actividades profissionais, mas também religiosas e, evidentemente, as prostitutas ou trabalhadoras do sexo.

Prostituição

A prostituição, “a mais velha profissão do mundo”, tem sido ao longo dos tempos descrita e narrada no ocidente como «um vício da ordem social que está ligado a uma necessidade primitiva do homem» (Cruz, 1984: 53). Zola, Tolstoi, Dostoyewsky são apenas alguns dos autores que matizaram com traços dramáticos a personagem frequentemente ousada dos meios camponeses que se dirige para a vida urbana e é empurrada pela miséria para a prostituição.



Figura 2 – O Fado


Em Da Prostituição na Cidade de Lisboa (1984 [1941]), Francisco Cruz esclarece que a palavra “prostituta” é o particípio passivo de prostitutas do verbo prostituo, que significa «prostrar, entregar, pôr publicamente de venda (…), mulher pública posta a ganho; é segundo as próprias expressões e linguagem da nossa antiga legislação no tempo do Sr. D. Manuel, uma mulher que com o corpo ganha dinheiro publicamente, não se negando aos que a ela quiserem ir fora da mancebia» (Cruz, 1984: 49). Neste curioso texto, o autor refere que «a prostituição toca nas primeiras idades dos povos do Globo. Pelos livros sagrados coligimos que existiam prostitutas no tempo de Moisés e que elas se entregavam a todo o género de deboche para satisfazerem as suas desordenadas e impudicas paixões ou com o fim dos lucros» (Ibid. 53). E não esqueçamos que a Bíblia afirma que não deve haver «nem prostitutas, nem libertinos entre os filhos de Israel» (Deutoron, cap.23, v.17).

Todavia, a história da prostituição apresenta extraordinárias contradições. Por exemplo, na Antiguidade, concretamente na Mesopotâmia do II milénio A.C., a prostituta era representada binariamente como puta/sacerdotisa, puta/deusa. A Grande Deusa Innana (que mais tarde se virá a chamar Ishtar) era ela própria identificada como “prostituta”. Porém, tal como indica o Épico de Gilgamesh, estas “prostitutas” antigas estavam longe de sofrer o estigma sentido pelas suas homólogas contemporânea (Shankar, 1990: 30-32; Scrambler, 1997: xi e 3).

Noutros locais, igualmente nos antigos tempos, os Japoneses tinham um culto à Deusa da Prostituição, em honra da qual estabeleceram várias festas públicas. Já na «Índia e no Egipto a religião e a política divinizaram os prazeres» (Cruz, 1984: 54). A prostituição religiosa encontrava-se amplamente disseminada em locais tão distantes como a Ásia ocidental, o extremo-oriente, a América central, a África ocidental, na Síria, na Fenícia, na Arábia, no Egipto (Shankar, 1990: 28).

Na Antiga Grécia, atribui-se o estabelecimento regular dos chamados “lugares de deboche” a Solon, «o primeiro que pelas leis favoreceu o Tráfico que faziam dos seus encontros as voluptuosas atenienses» (Cruz, 1984: 55). A estas cortesãs atenienses não se permitia a entrada na cidade e nos templos. Antes, os espaços onde se tolerava a sua presença e ocupação eram «as avenidas do cerâmico e a Arcada do Longo Pórtico, [onde] se ofereciam às primeiras vistas dos que chegavam ao Pireu, ou aí se embarcavam» (Cruz, 1984: 57). As cortesãs eram na sua maioria escravas cujos senhores «traficavam os seus encontros: era então toda a sua arte empregada em seduzir algum rico que as comprasse e lhes desse liberdade» (Ibid: 57).

Na Antiga Roma também se encontrava o “flagelo da prostituição”. Esta curiosa expressão é de Cruz, que salienta que «as leis de escravidão, e aquelas que então regulavam a união dos sexos, muito contribuíram para o incremento da prostituição, a ponto que o deboche público não chocava os costumes, antes deles fazia parte» (Ibid: 60). As mulheres que “exerciam o seu infame comércio” encontravam-se nos bairros mais retirados da cidade, «próximo dos muros, ao pé do Circo, do estádio e dos Teatros» (Ibid: 61).

Este pequeno apontamento sobre a história da prostituição revela que nalguns locais a actividade prostitutiva era constituinte da acção do sagrado e da religião, sendo uma prática de devoção e uma homenagem à divindade. Da selecção de visões aqui apresentada , permitam-nos destacar a obscuridade e a perda de valor e visibilidade que a “mulher pública posta a ganho” sofre com a aproximação a território europeu. Elas são afastadas dos templos e dos centros das cidades. Já não surgem interligadas com a divindade ou o sagrado. Pelo contrário, antes mesmo do Cristianismo se ter difundido, a visão da prostituta estigmatizada já estava alicerçada nas mentalidades dos actores sociais. É por isso que ainda hoje as mulheres que trabalham na prostituição são vistas como “más mulheres”, que infringem as normas aceitáveis de feminilidade e são por isso alienadas dos seus direitos.

Porém, o debate contemporâneo sobre esta actividade começa a dar alguns passos em frente. Alguns países aceitam a prostituição como uma profissão legítima. A maioria porém não a regula nem criminaliza. A prostituição não é ilegal, mas na sociedade contemporânea é percepcionada como um crime contra a moral. É que «em quase todos os povos do mundo é a prostituição um negócio de interesse» (Cruz, 1984: 54). A prostituta, todavia, encontra-se excluída da sociedade. É vista como moralmente suspeita e tornada invisível (Scrambler, 1997: 7). O estigma da prostituição afecta todas as mulheres que com o seu corpo se dedicam a uma actividade profissional ou religiosa. Atendamos agora ao papel das Devadasi neste contexto.

Devadasi

As Devadasi ou bailadeiras, dançarinas ligadas aos templos hindus na Índia, padecem do mesmo estigma, ainda que a sua prostituição seja categorizada como religiosa. A devadasi dança e canta entusiasticamente nas cerimónias religiosas. Para além disso, faz parte das suas funções a entrega do seu corpo à divindade a que se que devota, à casta Brahman e ao “seu senhor” ou “patrono”, e actualmente aos homens ricos (Shankar, 1990: 16), a troco de uma mais-valia em dinheiro (Shankar, 1990: 16). Perez, todavia, sublinha que as bailadeiras não se envolvem com homens que não sejam Brahamns hindus, ainda que existam dados que comprovam que Brahmans católicos também se envolviam com devadasi. A conjugalidade entre uma devadasi e um brahman termina apenas quando ele morre e a sua família aceita esta relação, contrariando a concepção hindu de adultério, a aparentemente esta família se encontra imune (Perez, 2005: 140).



Figura 3 – Imagem do filme Sringaram - Dance of Love

A dança e a prostituição têm sido percepcionadas como inseparáveis na Índia, desde os primórdios (Shankar, 1990: 42). As servas da divindade não estão autorizadas a casar com qualquer homem mortal. A sua dedicação ao templo é considerada um casamento com a própria divindade (Perez, 2005: 132). São as únicas mulheres que tomam parte das festividades e rituais da divindade como especialistas rituais ou sacerdotisas (Shankar, 1990: 16). No passado, estas mulheres eram ainda as únicas que tinham o privilégio de aprender a ler, dançar e cantar.

Este culto encontra-se ainda hoje disseminado por toda a Índia, mas existem provas que corroboram a origem da sua existência entre os séculos X e XI da nossa era (Ibid:111). Com o crescimento da urbanização e da prostituição comercial, este culto permanece hoje popular. Depois da cerimónia de iniciação, as mulheres migram para cidades próximas ou remotas para praticar a actividade prostitutiva (Ibid: 17). É esta a forma de passar do culto para a prostituição comercial, ainda que as mulheres que se identificam como devadasi sejam regidas por regras que não envolvem aquela prostituição e retenham um estatuto mais alto que as suas congéneres fora do templo. As devadasi encontram-se ao serviço do deus. Não sentem por isso qualquer relutância ou estigma social. Shankar não deixa contudo de chamar a atenção para o papel da pobreza para o aumento do “clã devadasi” (Ibid: 17). O que a devadasi entrega à divindade é o que de mais valioso uma mulher pode oferecer: a sua castidade.

«Under the male deity the sacred prostitution plays the part of a concubine while under the female deity, she plays the role of stand-by or substitute, always ready to symbolize by her action the purpose of great fertility and mother goddess» (Shankar, 1990: 32).

O domínio colonizador, britânico e português na Índia, ainda que advogasse a moralidade vitoriana, sustentou indirectamente este culto. Com o estabelecimento de bases militares pelo território, era necessário fundar verdadeiras “colónias de prostitutas” (Ibid: 122). Os autores coloniais essencializaram constantemente as dançarinas dos templos como “prostitutas”, uma categoria opaca no discurso legal anglo-indiano (Parker, 1998: 559).

No inicio do século XIX, contudo, as devadasi gozavam de um prestígio considerável na sociedade hindu “tradicional”. Todavia, com o intuito oficial de “salvar” estas mulheres, e de as recuperar para o casamento convencional, o culto devadasi torna-se crime. Para tal, os tribunais anglo-indianos utilizaram o conceito de prostituição na sua expressão mais lata - a ocorrência de sexo, fora do casamento normal. Os colonizadores não entenderam que o culto era mais que simples troca comercial de sexo. As funções da devadasi nos ritos sagrados não podem ser reduzidas às de uma prostituta (Parker, 1998: 598). O sexo realizado por uma serva de um deus é sagrado.
Porém, novamente, quando uma mulher faz uso do seu corpo para desenvolver as suas actividades, profissionais ou religiosas, é rotulada de puta, uma pessoa com menos direitos, visto renegar as suas obrigações de esposa (convencional) e de mãe. Torna-se por isso uma menor mulher, uma pessoa imoral, e portanto invisível.

Corpos (I)Morais

Um dos mais importantes utensílios que permitem a manipulação das visões políticas sobre o “lugar de cada um” é o género. As assimetrias deste conceito permitem representar metaforicamente o “eu” e o outro, a mulher e o homem, a Europa e outros locais. É uma forma de reificar as diferenças entre culturas (Perez, 2005: 129-130) e entre pessoas. O género é simultaneamente uma interpretação das diferenças sexuais e uma forma de exercer poder sobre os corpos (Castelli, 2001: 3).

Neste contexto, o colonialismo, como no caso da Índia britânica ou portuguesa, construiu-se com base em imagens sobre as mulheres, e não das mulheres (Perez, 2005: 130). Porém, atendamos, o lugar da mulher, em qualquer sociedade está precisamente cimentada em imagens que lhe foram impostas ao longo dos tempos. As imagens orientais, nomeadamente muçulmanas, contudo, têm alimentado a imaginação ocidental: o harém, o véu, a poligamia funcionaram como sinónimos de dominação, de opressão feminina e de erotismo (Ibid: 131). Perez apresenta um excerto de As Bailadeiras de Propércia Correia Afonso que, na opinião da autora, contém o discurso representativo da moralidade católica colonizadora: «mulheres que, habitando geralmente perto dos pagodes, têm a profissão de dança e exercem a prostituição como deveres inerentes à sua casta [...]. Vítima ela própria do sistema social e religioso em que nasceu, a sua existência é uma ameaça constante para a moral da sociedade, que não só permite a sua existência como a condena irremissivelmente ao seu triste modo de vida (Perez, 2005: 136; nossa ênfase). A moralidade é inegável na construção do outro.

Os aspectos doutrinais formadores de qualquer comunidade incluem dogmas religiosos, morais, sociais, que governam o que cada sociedade pensa de si e dos outros. Valores, atitudes e ideologias de uma dada sociedade estão literalmente agregados no corpo biológico (Perez, 2009: 31). Os próprios corpos revelam os paradigmas das estruturas sociais. Mas também são um lugar de luta política. O poder de regular o que os corpos – as pessoas enfim - têm liberdade para fazer ou não tem resultado na exclusão de corpos estranhos, fora das normas morais. É o caso das mulheres que quebram as regras, que entregam o seu corpo em nome de uma profissão, de uma actividade, de uma religião ou culto. Os valores que regulam o corpo da mulher continuam a estar poluídos com os conceitos de submissão e controlo da sua sexualidade e agressividade (Das, 1987: 57).

Costuma dizer-se que o verdadeiro lugar da sexualidade é o cérebro, querendo com isso significar-se que é aí, nesse lugar por excelência de todas as fantasias, que o desejo em última instância se acolhe e se reinventa. Mas talvez isto não seja na verdade exacto. Porque o cérebro e as suas fantasias não existem em estado de absoluta liberdade. Nesta como noutras matérias a nossa capacidade de imaginar está dependente das fantasias geradas pela sociedade no seu todo. É por isso que talvez possa considerar-se que a sexualidade é globalmente cultural.

Porém, a mulher erótica que se permite entrar nessas fantasias globalmente culturais, é excluída e imoralizada apenas porque a sua sobrevivência requer a utilização corporal – seja no caso da prostituição comercial ou da prostituição religiosa.


Bibliografia

Beauvoir, Simone De, 1976, O Segundo Sexo, vol. II, Amadora: Bertrand
Castelli, Elizabeth A., 2001, «Women, Gender, Religion : Troubling Categories and Transforming Knowledge», Women, Gender, Religion: A Reader, Nova Iorque: Palgrave/St. Martin's Press.
Cruz, Francisco I. S., 1984 (1941), Da Prostituição na Cidade de Lisboa, Lisboa: Publicações Dom Quixote
Das, Veena, 1987, «On the body and the sexuality", Contributions to Indian sociology (n.s.) 21, 1, Nova Deli: Sage Publications
Eliade, Mircea, 1977, Tratado de História das Religiões, Lisboa: Edições Cosmos
Evola, Julius, 1969, Rivolta contro il Mondo Moderno, Roma: Edizioni Mediterranee
Gimbutas, Marija, 1999, The Living Goddesses, Berkeley : University of California Press
Godelier, Maurice, (1982)1996, The Making of Great Men: Male domination and power among the New Guinea Baruya, Cambridge: Cambridge University Press
Goddart, Victoria Ana (ed.), 2000, Gender, Agency and Change, Londres e Nova Iorque: Routledge
Grittner, F. K. (1990), White Slavery: Myth, Ideology, and American Law, Nova Iorque e Londres: Garland Publishing
Groddeck, Georg, 1963, Le Livre du Ça, Paris: Éditions Gallimard
Jenkins, P. (1992), Intimate Enemies: Moral Panics in Contemporary Great Britain. New York: Aldine de Gruyter
Nietzsche, Friedrich, 1988, Assim falava Zaratustra, Lisboa: Relógio d´Água
Parker, Kual, 1998, «A corporation of Superior Prostitutes» - Anglo-Indian Legal Conceptions of Temple dancig Girls, 1800-1914 », Modern Asian Studies 32, 3, Cambridge: Cambridge University Press
Perez, Rosa Maria, 2005, «The Rhetoric of empire - Gender representations in portuguese India», Portuguese Studies, Nº 21
Perez, Rosa Maria, 2009, «Body and Culture. Fieldwork Experiences in India», Portuguese Studies; vol.
Ramonet, Igancio (org), 2004, Mulheres Rebeldes, Lisboa: Campo da Comunicação
Scrambler, Graham e Scrambler, Annette, 1997, Rethinking Prostitution: Purchaising sex in the 1990s, Nova Iorque: Routledge
Shankar, J., 1990, Devadasi cult - A sociological analysis, Nova Deli : Ashish Publishing House
Spector, M. e Kitsuse, J. I. (1977), Constructing Social Problems, Menlo Park, Calif: Cummings Pub. Co
Weininger, Otto, 1975, Sexe et Caractère, Lausanne: Éditions l’Age d’Homme

*Ensaio apresentado na cadeira de PDA: Abordagens Regionais em Antropologia (ISCTE, 2009)

domingo, 24 de outubro de 2010

Liberdade de expressão





fotos que fizeram parte de uma campanha publicitaria realizada pela agencia Ogilvy & Mather (Frankfurt, Alemanha) para a Sociedade Internacional dos Direitos Humanos. Ganharam medalha de bronze no Premio Clio 2009 de Nova York.

Campanha Contra a Homofobia

terça-feira, 12 de outubro de 2010

"French police take DNA samples of Roma"...?!?

Segundo a French Human Rights League, romanis em França estão a ser alvo de testes de ADN...para eliminar os campos nómadas ilegais.

http://www.france24.com/en/20101007-french-police-accused-keeping-secret-lists-roma

O III Reich não fez algo parecido?
O governo francês anda a competir com o [seu] mestre hitler...?

domingo, 10 de outubro de 2010

Contra a Pena de Morte

Dia Internacional Contra a Pena de Morte

Alguns números de execuções em 2009, avançados pela Amnistia Internacional...


http://www.amnesty.org/en/death-penalty

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

problemas como lucro?

«we have to create problems to create profit»

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

A Jenny

Estou metida em mais um projecto de rua: o PREVIH, uma parceria entre várias ONGs e ARS. Saímos de carrinha-laboratório. Fazemos inquéritos a trabalhadores do sexo, entregamos preservativos, e convidamo-los a fazer o teste rápido do HIV.

Hoje estivemos no Cais do Sodré e no Restelo.

Numa destas rondas, conheci a [chamemos-lhe] Jenny, 28 anos, nigeriana, mãe de 2 filhos que vivem com a avó, viajante nata - o discurso de quem adora viajar é facilmente perceptivel. Da Nigéria foi para Marrocos. Viveu 6 meses em Tânger. Depois fez a travessia. Esteve em Málaga. Um dos irmãos está em Itáila. Sugeriu-lhe que viesse para Portugal: "é barato, é seguro, é um país tranquilo". Portugal está bem cotado lá fora.

A Jenny está em Portugal há 2 anos, vive em Lisboa. O namorado vive na Holanda. De momento, "está bem assim". Gostava de ter mais filhos, mas será "com o pai dos meus filhos, que está na Nigéria. Ele adora-me, mas eu quis vir. Está sempre a pedir para voltar para casa. Está à minha espera. E um dia vou voltar sim".

A Jenny trabalha num café durante o dia e ocasionalmente vem para a rua prostituir-se. Os pais não sabem. É cristã. Diz-me que nem sequer fuma.

Para além do dinheiro que faz para si, para pagar renda e contas, comida e roupa, envia tudo o que pode para a terra natal: para ajudar a pagar contas e luxos, mas principalmente a educação dos seus filhos que estudam em colégios particulares.

Como estamos à espera do resultado do teste, e mesmo quando se sabe que se usa sempre o preservativo, os nervos atacam qualquer um - e não apenas trabalhadores do sexo, longe disso! - trocamos dicas de viagens. A mim, a Jenny aconselha-me a ir visitar a Guiné Conakri, diz que é fantástico. Da África do Sul não gosta tanto. O pai vive lá. Diz-me para ter cuidado com a comida se um dia for ao Mali. E que a Nigéria é um mundo, também a visitar.

Mas para já a Jenny vai continuar por cá mesmo. Gosta de Lisboa, gosta da vida que tem aqui, mantém os objectivos que quer, entre os quais o dinheiro que faz e envia de 3 em 3 meses para a família. Só as saudades é que custam. Saudades da mãe, dos irmãos, mas principalmente dos filhos.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

regresso à rua

Nas ruas de lisboa, nas áreas do trabalho sexual, mantém-se a "crise".

- Isto anda mau. As melhoras alturas não são o verão, a família está de férias, e se as coisas estão bem em casa, eles não nos procuram. As melhores alturas é a época do Natal!

...pois, de facto, o natal é a época "do amor"! Está certo.

Passam, como sempre, muitos carros. Alguns com clientes, alguns com aqueles tipinhos que só passam para insultar. Neste campo, tudo na mesma.

O Conde Redondo está vazio, consta que é resultado de uma rusga feita ali e ao desmantelamento de uma rede de exploração. É possível e provável.

Reconheço a maioria das caras, mas noto mais ausências.

Volto a ouvir que é perigoso ir para a rua sozinha.

domingo, 8 de agosto de 2010

sábado, 7 de agosto de 2010

a qualidade da saúde democrática

"¿A qué factores cabe atribuir este síndrome de alienación democrática, que se manifiesta por una aguda crisis de desconfianza hacia nuestras respectivas clases políticas?"

Os que de entre vós se sentirem preocupados com o estado das nossas sociedades não percam este artigo hoje publicado no Babelia (El País). Não dá soluções, mas desempenha a função importantíssima de delinear uma cartografia dos problemas e de sinalizar alguns dos autores que os pensaram:

Fonte: http://www.elpais.com/articulo/portada/calidad/vida/democratica/elpepuculbab/20100807elpbabpor_28/Tes

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

gostava de ver...

acabar com o actual sistema partidário.
dissolver a assembleia.
criar novos grupos de interesse: clãs profissionais com assento na assembleia. why not?

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

La pire réponse

"O Jean Daniel é uma das grandes figuras de referência do jornalismo de esquerda europeu. Recebeu há um ano ou dois o Prémio Príncipe das Astúrias, que é para o mundo hispânico o equivalente do nosso Prémio Pessoa.

Acontece que esta pequena crónica é brilhante e põe os pontos nos is sobre as derivas securitárias do Sarkozy. Em síntese, o que ele diz são duas coisas:

- a esquerda não deve criticar o Sarkozy por ele se preocupar com as questões da segurança, uma vez que as verdadeiras vítimas da insegurança não são os ricos, mas os pobres.

- mas a esquerda deve preocupar-se e muito com o modo como o Sarkozy aborda a questão da segurança, porque dar a entender que os franceses de origem estrangeira são os grandes causadores da insegurança é simplesmente prestar um mau serviço à própria causa da segurança. E também porque a sugestão de retirar a esses franceses a cidadania é uma infâmia que faz lembrar os tempos de Vichy e do fascismo."(JCA)

Fonte:
http://jean-daniel.blogs.nouvelobs.com/archive/2010/08/05/la-pire-reponse.html

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

limpar portugal...começar pel@s portugues@

Há lá coisa mai linda que vir no bus e de repente haver porrada!

Uma tipinha daquelas que não fazem falta vivas insurge-se quando o motorista lhe pede que pague o bilhete.

O carrinho de bébé que leva com mais duas amigas já está no lugar.

Não sei porquê desata aos berros com uma velhota que podia ser avó dela e levanta-lhe a mão para lhe bater.

Um homem levanta-se a agarra-a. Começa a peixarada a sério:

"Saí da cona da mha mãe há 27 anos! O meu marido não me bate, e bates-me tu?!?".

A tipinha aproxima-se do carrinho de bébé (onde está de facto um bébé) e puxa de uma ponta e mola de dentro da mala. Ainda acerta no tipo, mas não faz moça.

O bus parado nas amoreiras, a porta aberta e tudo aos berros. As 3 tipinhas e o carrinho de bébé saem com ameaças a toda a gente desde a velhota, ao motorista, ao tipo que se levantou para defender a velhota.

A situação é comunicada à carris e polícia. Não deve acontecer nada claro.

Mas a criança ao menos devia ser retirada. Quer dizer...uma ponta e mola junto ao bébé?!...sou só eu ou o meu país tem gente desta a mais, desnecessária?

Não houve uma campanha ecológica chamada "limpar portugal"?...Falharam nitidamente Lisboa.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

quinta-feira, 22 de julho de 2010

auto-terapia


a pior história que ouvi até hoje...

Contaram-me a seguinte história na rua:

"Há uns anos atrás sentei-me num banco no Parque Eduardo VII a fumar um cigarro. Surge uma miúda, que me pede um cigarro. Era novinha. Perguntei-lhe que idade tinha.
- Tenho 12 anos.
- Estás aqui sozinha ou com a tua mãe?
- Estou com a minha mãe. Ela faz relações com os homens. Eu faço os beijinhos. A minha mãe diz que tenho de pagar o que gasto, a roupa, os sapatos, a comida.
Passado alguns minutos, a "mãe" passa dentro dum carro com quem esteve a negociar e chama-a porque "está na hora de trabalhar"...

quarta-feira, 21 de julho de 2010

mais uma ronda solitária nocturna

Encostada a um posto de electricidade, o "do costume", a escrever histórias para crianças que me são ditadas. Muito carro parou hoje! Um cliente mais afoito, bem parecido, aí com uns 30 anos, fala directamente para mim: "como se chama a menina?" hahahahah a rua está sempre a surpreender-me! Aceno que "não".

Muitas conversas e umas horas depois, encontro a Rosa. É romena, não fala português, mas percebe o que quero. Começa a chamar a colega? "Oh Cris, oh Cris anda cá! para interprete". Não é a Cris, é o Cris, que está metido no carro estacionado mesmo em frente. Oh diacho, um chulo por interprete? "Não, ele protege, mas dorme". Realmente nem se mexe. Ok, passo umas horas mais tarde. E passo, mas já lá não estão.

Mais abaixo, numa esquina, aguardo uma transgender zangada (não comigo) que me pede para esperar, enquanto negoceia com um cliente. Fico sozinha portanto na esquina: olha a minha sina! Pára muito carro, um deles com um avó simpático lá dentro. Mais um "não" acompanhado já por um "Porra! Não!!!" mental.

Do outro lado da estrada, do lado do Parque Eduardo VII, mesmo em frente ao hotel, no escuro, um homem sentado que, de longe (bem longe) me acena olá com a mão. Eu fico só especada a ver quem é e o que está ali a fazer tão sossegado e meio escondido. Mas regresso à postura de "nem te estou a ver" quando o corropio de carros recomeça.

E quando volto ao carro, percorro cada esquina, para desejar boa noite a todas.
Já dentro do carro, uma ainda me diz: "ena! ainda aqui está?!" é. desta vez vim quase com elas para casa.
Mas de repente vejo: conheço quase todas as caras, quase todos os nomes, e algumas a despedida é mesmo com um abraço. A proximidade faz-se assim, devagarinho, conquistando confiança q.b. Aquela rua hoje era tão minha quanto delas.

terça-feira, 29 de junho de 2010

Fazendo Género 9

http://www.fazendogenero9.ufsc.br/simposio/view?ID_SIMPOSIO=19

quarta-feira, 23 de junho de 2010

TSH 2009 - 7 vítimas confirmadas em 84 sinalizadas

"Durante 2009 foram sinalizadas 84 potenciais vítimas, correspondendo a 70 sinalizações via GUR e 14 sinalizações via GS. Deste grupo, foram até à data confirmadas 7 vítimas."

In: Relatório Anual sobre TSH em 2009
Disponível em: http://www.otsh.mai.gov.pt/cms/files/conteudos/Manual_portugues.pdf

a prostituição é natural?

estava eu no "gabinete" e ouvi dizer: "eu não ando a roubar nem a matar. então agora os homens não se casam com homens e as mulheres com mulheres? isso também não é natural. mas agora é igual. porque é que a prostituição também não há-de ser vista como uma profissão? natural?"

terça-feira, 15 de junho de 2010

2010 Trafficking in Persons Report USA

http://link.brightcove.com/services/player/bcpid1857622883?bctid=95672570001

- O Tráfico mantém-se uma prioridade "top".
- Os EUA são pela primeira vez analisados também (hurray hã).
- A exploração laboral torna-se um eixo fundamental.
- O tráfico intra-fronteiras também.

A repressão do tráfico e da exploração de pessoas deve ser brutalmente observada.
Mas a simples repressão não resolve o problema estrutural que permite situações de exploração: a necessidade de migrar - mesmo dentro de um país - para sobre viver e procurar melhores condições de vida.

Ora, tod@s nós temos o direito de viver onde quisermos, de escolhermos o país onde queremos fazer a nossa vida. Quem desejar mudar de local ou mesmo de país deve ter a oportunidade de o fazer na maior segurança, segurança essa que deveria ser imputada aos estados de origem e de destino. Em vez disso, no caso da Europa, temos a Directiva de Retorno.

Mas quem não quer deixar o seu país, a sua família, a sua vida também deve ter esse direito assegurado.

Se um dos grandes problemas que permitem o tráfico é a necessidade de migrar, então os estados - todos os estados, visto o problema ser "global" - devem ser chamados a construir ou ajudar a construir sustentabilidade e futuro, instalar empresas e projectos de desenvolvimento ambiental, escolar, energético, farmaceutico... - projectos reciprocos, que não são só os paises desenvolvidos que têm know how. Num mundo global, a mais valia de cada região é o conhecimento local. Falo por mim, gosto muito de saber e ter coisas únicas.

Além do mais...os terrenos e os salários em países terceiros não são mais baratos? A Europa não tem cuidado do seu "quintal das traseiras", como dizia um grande amigo referindo-se a África, e arrisca-se a perde-lo para a China. Geopoliticamente falando, será bom ser cercado pelo gigante chinês? Fosses mais rápida, Europa, agora já foste! Os EUA vão pelo mesmo caminho com a América Latina.

Não era dificil eliminar o tráfico, se houvesse mesmo vontade de o fazer. Bastava eliminar a necessidade de intermediários, tirar o "emprego" aos traficantes, e tornar cada estado o "RP" e "director de recursos humanos" das suas populações. E resposanbilizar cada individuo pelas suas próprias escolhas e decisões.

Já eliminar a exploração...não verei nada disso no "meu mandato". A exploração faz parte do nosso código genético. A liberdade também devia ser...

Ajuda Humanitária?! Não! Guerra!

«"Navios iranianos preparam viagem humanitária para Gaza"
Navios iranianos com auxílio para Gaza devem partir na próxima semana, noticiou a agência noticiosa estatal IRNA, citada pela AlJazeera.Net. A concretizar-se, a acção fará subir a tensão na região.» (Público, 15.06.2010)

Fonte: http://www.publico.pt/Mundo/navios-iranianos-preparam-viagem-humanitaria-para-gaza_1441970

Ah! Assim gosto mais! "Ajuda humanitária" sem subterfúgios "do bem". Não! Ajuda humanitária para incentivar a guerra! Pois claro, what else, não tem sido sempre esse o objectivo?!Esse ou só a letargia das populações? "Queres comer? Toma lá que os povos desenvolvidos dão, mas ficas aqui quietinho e não resmunga". Ao menos desta vez o objectivo "guerra" é às claras!

Começo também a indagar se isto não tem sido uma armadilha, com meios trágicos de morte de activistas, para o resto da malta da zona forçar um conflito. Os serviços secretos israelitas não eram dos melhores do mundo...? Alguma coisa não bate certo...

Mas alegremo-nos! Deve vir aí guerra não tarda!

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Igualdade é a minha palavra favorita

Porque é que se há-de assumir que as mulheres são sempre vítimas e pouco devem à inteligência, dado que não conseguem escolher as suas próprias vidas?
Porque é que se há-de aceitar que é muito mais honroso trabalhar 24 horas e receber 300euros ao fim do mês a lavar escadas?
Porque é que se continuará a tomar por adquirido que a vagina é sagrada, mais sagrada que qqualquer outra parte de um corpo, e que não deve ser alugada? E porque é que se aceitará o "sacrificio" cada vez mais frequente de gente em apuros que vende os seus orgãos?
Porque é que ao mesmo tempo que se legisla o tráfico de seres humanos se impõe mais restrições às fronteiras? Porque é que se ouve falar de casos de potenciais vítimas de tráfico deportadas porque estavam ilegais? Porque é que nunca se fala dos homens, que também são explorados, que também vendem o corpo, que também têm as mesmas dificuldades de vida das mulheres?
Porque é que o discurso do tráfico não mudou nada nos últimos 100 anos?
Porque é q o discurso da vitimização vende sempre tanto?
Porque é que não se aceita que uma pessoa é livre, realmente livre, e portanto deve ser responsabilizada pelas suas próprias acções? Porque é que "há uns filhos e outros enteados"? Porque é que a Igualdade não é a palavra de ordem para mulheres, homens, trangenders, nacionais, imigrantes?

o crime de acreditar na unidade da humanidade

sábado, 24 de abril de 2010

Caso de Tráfico de Pessoas?

Esta mensagem destina-se a tod@s, e particularmente a quem anda no terreno.

Quando detectarem casos que suspeitem ser de tráfico de pessoas, mas houver perigo iminente para vós, liguem para o 112.

Se não houver perigo iminente, e vos parecer um caso de tráfico liguem para:

1) A equipa multidisciplinar do Observatório do Tráfico de Pessoas: 964 608 288

2) A Linha SOS Imigrante: 808 257 257

Não deixem de qualquer forma de ligar para o 112, para apresentar queixa ou fazer a denúncia (mesmo que anónima).

Para mais informações ou esclarecimento de dúvidas, espreitem o site do Observatório do Tráfico de Seres Humanos:

http://www.otsh.mai.gov.pt/?area=007&mid=000&PHPSESSID=7fbfe6a966a636a6207dded78237abe8

Não se esqueçam que calar é consentir. Fechar os olhos e considerar que "não nos devemos meter" é ser cumplice. E em caso de dúvida, é preferivel denunciar! É que pensem lá: e se um dia for convosco ou com um dos vossos?

rapaz português ia ser vendido por 4 mil euros

No JN Online surge hoje a noticia de quem um rapaz de 15 anos, de Vizela, ia ser vendido por 4 mil euros para trabalho escravo. A PJ e a Polícia Nacional de Espanha resgataram o jovem em Ourense, na Galiza. A investigação terminou com 6 detidos.

"Ao que o JN apurou, o rapaz marcou encontro em Braga com alguém que conheceu na net, mas algo correu mal. De Braga, João foi para o Porto. Vagueava pela estação da CP de S. Bento quando foi apanhado pela rede. Este tipo de locais são os preferidos pelos "recrutadores". João, aparentemente alheado, desorientado e confundido pelo movimento de pessoas, sobressaiu de imediato aos seus olhos treinados para reconhecerem potenciais vítimas.

João, oriundo de um meio familiar desestruturado não teve que pensar muito tempo para resolver acompanhar o grupo até Espanha, atraído por falinhas mansas e promessas de solidariedade, de trabalho e de uma vida melhor. A partir daqui já não havia saída.

Segundo a PJ, o rapaz foi agredido e obrigado a viver numa cave cheia de lixo, juntamente com animais, e ali ficaria até que surgisse alguém disposto a pagar os cerca de quatro mil euros que eram pedidos pela sua força de trabalho. Em Madrid, até já existiria um eventual interessado. Todo o esquema foi desmontado graças a uma chamada telefónica que o rapaz conseguiu fazer para a mãe (que já tinha comunicado à GNR o seu desaparecimento). PJ e a Polícia espanhola localizaram a chamada e libertaram o rapaz.

Um homem português e uma mulher espanhola, casados, e um terceiro indivíduo foram presos. Outro homem, também português, foi detido em Madrid, mas foi posto em liberdade. Mais dois homens foram presos em Ourense, anteontem, e também libertados. As autoridades julgam ter neutralizado a rede, mas não têm dúvidas de que haverá mais a operar nos dois países" (in http://jn.sapo.pt/PaginaInicial/Policia/Interior.aspx?content_id=1552092).

Parece-me que o jovem e a polícia estão de parabéns. Nem sempre é assim. Apesar da imensa visibilidade da questão do tráfico, o que é facto é que no concreto existem situações que não são "preto no branco" e podem ser entendidas de outras formas.

Do que é que estou a falar? De um caso que me contaram, uma mulher estrangeira (de um país terceiro), trabalhadora do sexo, que se encontrava em situação de tráfico aqui em Portugal. Esta mulher conheceu um grupo de acção que a quis ajudar. Contactaram a polícia. No final, a mulher acaba por ser deportada por estar em situação ilegal. Acabou por dizer, em forma de despedida "às suas salvadoras" que "a pior coisa que me aconteceu foi ter-vos conhecido e ter-vos contado a minha história". Esta é apenas uma de várias histórias que acabam assim.

Talvez a sorte do rapaz de Vizela tenha sido o facto de ser português. Se fosse imigrante, ainda por cima em situação irregular, poderia ter sido simplesmente deportado...

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Pena de Morte na Arábia Saudita

"Arábia Saudita - Libanês condenado à morte por feitiçaria"

A qualquer momento o libanês Ali Hussain Sibat, de 46 anos e pai de cinco filhos, pode ser executado na Arábia Saudita, acusado de “feitiçaria”. Era apresentador de televisão a trabalhar para uma estação via satélite libanesa...no seu programa dava alguns conselhos aos telespectadores e fazia previsões sobre o futuro.
Em Maio de 2008, foi em peregrinação até à Arábia Saudita, onde preso pela polícia religiosa do país, chamada Mutawa’een, acusado de praticar “feitiçaria".
Foi condenado à morte no dia 9 de Novembro de 2009, numa audiência que decorreu à porta fechada e sem direito a representação legal ou assistência. A sentença: condenação à morte por “feitiçaria”, um crime que nem sequer está previsto na lei do país, mas que já serviu anteriormente de justificação para execuções.

Mais informações sobre o caso em:

http://www.amnesty.org/en/news-and-updates/news/death-sentences-saudi-sorcery-claims-20091210

Assina a petição até terça-feira, dia 27 de Abril em

http://www.jotform.com/form/1110025561

Fonte: Amnistia Internacional

quarta-feira, 14 de abril de 2010

o beijo

em homenagem a uma acção tão boa e à arte, e porque me constou que ontem foi o dia do beijo (não fazia ideia, mas está bem), aqui deixo o meu de eleição.


Ouvi uma prostituta contar...

..."Atacaram-me com ácido. Fiz queixa na polícia a até identifiquei o tipo. Mas depois deixaram o caso ser arquivado".

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Nova saída para o Intendente

Chego pelas 16h. À esquina do Largo com a Almirante Reis lá está a Charity. Passei na semana passada, até com a minha irmã, para a ir cumprimentar só. Hoje de novo cara alegre quando me vê, dois beijinhos, "hey! how are?".
Apetece-me um café. Pergunto-lhe se quer vir comigo ao café em frente.
- No thanks, i just had lunch.
Ok, vou eu e já venho. No café está tudo a olhar para mim. Sou a única mulher ali. 2 minutos depois já está outra companheira feminina.
Regresso para junto da Charity.
- Can i smoke a cigarrete here with you?
- yeah sure.
- how´s the business?
- ah, no good.
- yeah, everyone is complaining in the streets.
Estamos ali um bocado na conversa sobre nada. Também faz parte. O tempo, está sol, que bom calor. É pena não haver clientes.
Pergunto pela Jennifer e pela Joy. "They´r not here now, maybe latter". Combinamos que na proxima 4ª, passo ali para ver se quer vir comigo à reunião das Irmãs Oblatas para a organização do desfile d@s trabalhador@s do sexo. Reparo em 2 homens ali a
fazer grandes avanços. Bolas, é para mim?! Não quero afugentar a clientela, nem criar inimizades, está na hora de ir.
- Ok, Charity, i´m gonna work, see if someone wants to talk with me. I´ll pass here when i´m donne, see if you are there.
- Ok, thank you, see you latter.

No centro do Largo estão 4 africanas. Uma afastada, encostada a um banco, as outras 3, dois passos à frente. Começo a conversa com uma que interrompe logo a dizer que "não fala inglês, não fala português, não". As outras já estão a olhar
para mim. Repito-me com o ar mais simpático que consigo. Uma delas, a mais arísca, diz-me alto e bom som "I speak chinese!", em inglês! Eu rio-me. "Ok. see ya."

Pois é, desta vez já não correu tão bem. As trabalhadoras do sexo hoje já não estavam tão dispostas a conversar comigo.
Porquê não sei. Uma possibilidade é, como me diz a Leticia, "segundas-feiras são dias de rezinguice para a maioria das pessoas. Não vejo motivos para o Intendente fugir à regra. Não te chateies com isso :)".

Uma pontada de medo etnográfico?! Espero que para a próxima estejamos todas mais inspiradas...mas como diz o José Mapril, "a etnografia aprende-se fazendo". Nem sempre corre bem, nem sempre é motivador, nem sempre somos bem aceites. Mas nem por isso se desiste.

tod@s somos crianças

witness

domingo, 11 de abril de 2010

ser pessoa é saber respeitar

Domingo, "o dia do senhor". E como já estou farta de gente, convém ser saudável para ver para além. Não estamos sozinhos. Há para aí muito que faz com que tudo valha a pena.
Se calhar o que faz uma pessoa é a capacidade de respeitar os nossos e os outros, os nossos semelhantes e não semelhantes. O respeito à vida que cá anda, que connosco partilha no nosso mundo. E, como sabem os melhores entre nós, os cientistas por exemplo, temos muito a aprender com os outros que também povoam a "nossa casa". Mas esse conhecimento já faz parte da espécie humana. Pensem nos clãs animísticos, aqueles grupos que "são" descendentes de espécies ditas animais (o clã do urso, ou da águia, ou do golfinho).
Porque no fim de contas é disso mesmo que se trata: esta coisa redonda no seio da qual vivemos é a nossa casa. Partilhamo-la pelo tempo que nos é dado para andar por aí. E quando se vive com "alguém" é obrigatório, se não a empatia, pelo menos o respeito.


outros mundus

Arte efémera

Porque há de facto especimes extraordinários!

"Kseniya Simonova is a Ukrainian artist who just won Ukraine's version of "America's Got Talent. She uses a giant light box, dramatic music, imagination and "sand painting" skills to interpret Germany's invasion and occupation of Ukraine during WWII"


sábado, 10 de abril de 2010

Reacções estúpidas perante casos de Violência Doméstica

1) Não faças alarido.
2) Não faças queixa.
3) Não te metas nisso.
4) Só dá trabalho.
5) Essa história está muito mal contada.
6) Já devias saber que era isso que te esperava.
7) A culpa é tua.

É impressão minha ou é preciso uma enorme carga não só de estupidez crónica, como de ignorância total, como de total falta de humanidade para ter uma saída destas quando se ouve uma história de alguém que é agredido por alguém que se pensa conhecer e se ama(va)?
Abram os olhos! Deixem de ser inuteis! São o que são enquanto não morrem! Tentem lá ainda ser pessoas!

sexta-feira, 9 de abril de 2010

a discriminação magoa

iguais sob a lei

cada pessoa pode ser descrita e pensada sobre vários aspectos. porque tod@s nós somos muitas coisas em simultaneo. mas tod@s somos - ou deviamos ser - iguais perante a lei: o doutor e o almeida, a médica e a prostituta, o polícia e o imigrante, o homem e a mulher.

tribal photo

porque não somos tod@s iguais, mas to@s temos iguais direitos a existir

http://www.tribalphoto.com/pages/home.html

caras do mundo

O ser humanos é um bicho estranho. Há especimes fabulosos, capazes de grandes actos, de grandes pensamentos, de grandes passos para o seguinte. Há outros capazes das maiores crueldades, de provocar as maiores tristezas, as maiores raivas, as maiores desilusões. E não raras vezes, o mesmo especime é capaz de ser grandioso e selvagem. Há lá bicho mais estranho, mais imprevisivel, mais incoerente. Mas também mais comovente, mais extraordinário.
Diferentes como somos, vivemos no mesmo espaço, num tempo partilhado pela memória ou pela actualidade. Somos a mesma especie.
Somos diferentes. Mas somos assim tão diferentes?

quinta-feira, 8 de abril de 2010

quarta-feira, 7 de abril de 2010

children see, children do

És uma pessoa. És um@ adult@. És um exemplo. Tudo o que fizeres vai reflectir-se nas novas gerações. Toma responsabilidade sobre os teus actos. E já dizia o ratinho da tabuada, "não faças aos outros o que não queres que te façam a ti".

APAV

terça-feira, 6 de abril de 2010

Renascer

Não há nada mais comovente e que provoque maior orgulho que ver o orgulho, a auto-estima e o auto-respeito estampados na cara de alguém que sofreu uma agressão pelas mão de quem ama. Ou neste caso, de quem amava (THANK GOD!!!). Cada um faz as suas escolhas e tem que viver com elas. Mas assitir ao processo de "morte" e "Renascimento" de alguém próxima está definitivamente na categoria: "Os momentos mais importantes que terei o privilégio de viver"!

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Uma tarde no Intendente

Sábado. Lisboa. Intendente. Meio da tarde.
Mais homens que mulheres. Uns velhotes residentes sentados num banquinho a conversar. Muito traficante de droga. Uma dúzia de trabalhadoras do sexo. Eu de caderno e lápis em punho ali a passear no Largo e a entrevistar as trabalhadoras do sexo (entrevistas rápidas, que tempo é dinheiro...embora a rua esteja "muito fraca").
Metade das prostitutas ali presentes são pretas novas, todas juntas, algumas ligeiramente afastadas, com quem se fala em inglês - as primeiras que abordo.

Uma delas é a Jennifer, do Ghana. Tem 27 anos. Está aqui no Intendente há 4 meses e trabalha nesta área - entenda-se no trabalho do sexo - em full time. Não tem qualquer outro emprego. O que a levou à prostituição?
- The money. I need to eat.
- How did it happen?
- I was begging for money and a person told me to come here.
- Who was he?
- No - e desvia a cara, olha para o lado. Não quer (não pode?) responder. Continuemos.
- How long are you in Portugal?
- 4 months.
- Ah so you came here at the same time.
- yes. no. i dont know - novo desvio de olhares.
- Why did you choose Portugal? - a esta nem sequer recebo um não. Só silêncio.Enveredemos por outro caminho.
- How much do you ask to your clients?
- 20, 15 euros.
- For what?
Nova nega. Esta não percebo muito bem.
- Do you think that prostitution should be legalized, i mean, treated like any other job, working in a shop or in domestic service, or...
- No. I dont like it. Nobody likes it, to be a prostitute - ao lado surge um homem, um amigo delas, que se junta a nós. Estamos ali à porta da loja de esquina, elas duas, agora 3, contando com ele, estão encostado de costa para a porta. Eu estou de frente a olhar para eles. Mas começa a chover e a Jennifer puxa-me para o lado deles, abrigados pela entrada da loja.
- Does your family know that your here? Do you send money?
- No. I dont send and they dont know that i´m a prostitute. But i´ve never been exploited. Nobody misstreat me. I have the like to live. I like to live.
Somos interrupidas pelas restantes mulheres do grupo que se aproximam e que falam uma língua que não sei identificar. Aproveito para fazer publicidade ao 1º de Maio.
- Yes, a gathering, a concentration of the workers and also the sex workers, for the rights of all the workers. I´m sure Irmãs Oblatas will tell about it - Todas aqui conhecem as Irmãs Oblatas, cujo centro fica nesta zona. São as Irmãs Oblatas, que oferecem cursos de integração às prostitutas e que já andam em rondas nestas ruas há muito tempo, que "batem esta zona". Daí que eu nunca cá tenha vindo antes. Aqui ninguém me conhece, ao contrário de outras zonas do mapa da prostituição de rua da cidade Lisboa, cujas zonas - Artilharia 1, Praça da Figueira, Martim Moniz, Cais do Sodré, Conde Redondo, Técnico - costumo "bater" nas rondas em que participo com o RedLight e a Umar (e as Panteras Rosa, cujas rondas neste momento estão desactivadas). Com as Irmãs nunca trabalhei. Por escolha, identifico-me mais com os projectos com que estou envolvida que com as Irmãs, cujo importante trabalho reconheço e respeito, mas que ideologicamente não se coaduna com as minhas próprias ideias - I will be there, if you wanna show up - a trocar sorrisos simpáticos, dou-lhes o meu contacto. Não peço o delas.

A aceitação é muito melhor do que estava à espera. Elas falam comigo, são até simpáticas, apesar do controlo apertado que fazem umas das outras.
Uma das entrevistas é feita com o tipo mesmo ali ao lado a ouvir a conversa [que me interessa a mim, não tenho nada a esconder, e até prefiro que todos saibam o que ando ali a fazer. Além disso, as perguntas são genéricas, contam-me o que quiserem, fazem sinal para mudar de pergunta quando não querem (ou não podem) responder].
Depois de abordar umas 5 ou 6 jovens - metade das quais me diz: "hoje não" ou "mais tarde" ou "não falo" - lá vou eu para o interior do Largo. Um pouco mais à frente estão mais trabalhadoras do sexo, mais velhas, portuguesas, algumas nitidamente toxicodependentes.
O que mais ouvi hoje foi "estou aqui, porque preciso de comer".
Passa um homem, um dali, com os olhos cheios de droga. Fica a olhar para mim, a ver o que ando a fazer. É óbvio que se vai meter comigo...o que é que vai sair daqui?
- Então, o estudo está a correr bem?
- Sim, até agora sim - respondo.

Saí de lá incolume. Ninguém me insultou. Ninguém me tentou assaltar. Ninguém foi agressivo. Muito pelo contrário. Toda a gente percebeu que estava ali a "aprender", que lhes fui pedir cumplicidade para perceber o mundo que elas habitam. Os das margens também têm coisas a dizer. Basta darmos-lhes essa possibilidade.

Afinal aquela zona não é o buraco (tão) obscuro que tinha pintado na minha cabeça. Quem lá vive, trabalha ou passa tempo (putas, chulos, traficantes de droga e residentes) é gente igual a mim.

E estar sempre preparada para o pior serve para viver grandes surpresas.

domingo, 4 de abril de 2010

Fazer sempre Queixa!

Não estás sozinh@! Não tenhas medo! Mas o primeiro passo tem de ser dado por ti. A culpa não é tua. Não foste tu que provocaste. A violência doméstica é crime, quem a pratica chama-se criminoso. Este crime mata mais que cancro ou acidentes de viação. Não entres nas estatísticas. Não te juntes ao grupo que nada faz, porque "já passou", porque "não me queria bater", porque "foi sem querer, não pensou, ficou fora de si", porque "jurou que nunca mais me agride". Não acredites em mitos! Acredita em ti!Faz sempre queixa na polícia, não deixes de ligar para o 112 ou dirigir-te à esqudra mais próxima! Verás que, ao contrário do que provavelmente pensas agora, estamos aqui tod@s, ao teu lado, para te apoiar!

"É muito triste nascer mulher"

http://www.youtube.com/watch?v=dp1-ncU2ilY&feature=related

Do nothing and you might as well lend a hand!!!

Não confundam "amor" com "bestialidade"



"Amo-te. Não volta a acontecer. Perdi a cabeça. Quem te manda tirares-me do sério? Desculpa. Não volta a acontecer. Jamais te faria mal. Amo-te"

Não se deixem enganar. E se se enganarem uma vez, não se deixem enganar uma segunda!

Calar é consentir!

http://www.youtube.com/watch?v=kNLleP5CJw0



Vergonha é uma pessoa bater noutra que a ama.
Vergonha é não gritar aos 4 ventos o que aconteceu.
Vergonha é fingir que nada se passou.
Vergonha é dizer "não te envolves, meteste numa carga de trabalhos, estás de fora, não tens nada a ver com isso".
Vergonha é não pedir ajuda.
Vergonha é não fazer queixa.
Experimentem deixar os outros ver o que se passa. Depois vejam se o agressor ou agressora continua a ser violento ou afinal é só mesmo cobarde.
Calar é consentir!