Faço parte de um movimento, a Rede sobre o Trabalho Sexual (RTS) portuguesa que faz, por sua vez, parte de um movimento mundial pelos direitos das pessoas trabalhadoras do sexo.
É por isso que sei que o Parlamento Europeu deliberou na semana passada sobre a actividade prostitutiva. Foi aprovado no Parlamento Europeu (com 343 votos a favor, 139 contra e 105 abstenções) um relatório da Comissão para os Direitos das Mulheres e Igualdade dos Géneros que recomenda a criminalização dos clientes que recorram aos serviços prostitucionais de pessoas adultas menores de 21 anos. A recomendação não é vinculativa, sendo cada Estado-Membro livre de acatar, ou não, a recomendação.
Como membro da RTS, considero (depois de ouvir anos seguidos pessoas trabalhadoras do sexo [ou seja, @s própri@s], activistas, académicos e técnicos sociais) que a criminalização de clientes de trabalho sexual viola as recomendações da Organização Mundial de Saúde, elaboradas em colaboração com o UNFPA, a ONUSIDA (UNAIDS), e a Global Network of Sex Workers Projects (NSWP). O relatório que fundamentou esta proposta confunde, como sempre nestas instâncias, trabalho sexual (situação em que há consentimento informado), com abuso sexual e tráfico de pessoas. SÃO COISAS DIFERENTES, MINHA GENTE!
O relatório foi denunciado - entre cerca de 550 outras entidades - pela Rede Europeia da IPPF (organização que trabalha em prol dos Direitos e Saúde Sexual e Reprodutiva, que a APF integra), pela La Strada International (uma federação de organizações de apoio a vítimas de tráfico de seres humanos, área em que a APF também trabalha), pelo European AIDS Treatment Group, pelo ICRSE, pela Tampep International Foundation, e pela Rede sobre Trabalho Sexual. Mereceu ainda o repúdio de 86 académic@s, entre quais, evidentemente, eu me incluo.
Criminalizar o cliente pode afugenta-lo, mas não vai nem proteger prostitutas, nem eliminar a prostituição. Há vários crimes de que as prostitutas são vítimas, alguns praticados pelos clientes. Mas roubo, violação, exploração sexual e tráfico de pessoas estão já consagrados na lei. E ao contrário do que se pensa, há muitos clientes, chamados de habituais, que são mais que clientes, são amigos. Muitas vezes as denúncias de maus-tratos partem deste tipo de cliente. Por exemplo, conheço prostitutas que foram salvas de violação por parte de clientes. Criminalizar não é a solução. Regulamentar é que é a solução.
10.03.2014
Filipa Alvim
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